Ambiente de alta diversidade e propício à produção de compostos
naturais, o mar tem sido fonte de novas substâncias e microrganismos
antitumorais descobertos pela equipe da professora Letícia Veras
Costa-Lotufo, do Departamento de Fisiologia e Farmacologia da
Universidade Federal do Ceará (UFC), em Fortaleza.
A pesquisadora apresentou as potencialidades das espécies oceânicas
no combate ao câncer durante Workshop sobre biodiversidade marinha:
avanços recentes em bioprospecção, biogeografia e filogeografia,
realizado em São Paulo.
"No ambiente marinho, há pressões ecológicas que favorecem a defesa
por meio da produção de substâncias", disse Letícia, explicando que
essas moléculas são produzidas pelo chamado metabolismo secundário de
animais e vegetais marinhos.
O grande número de predadores e a acirrada competição por espaço são
algumas ameaças presentes no mundo marinho. Tais adversidades fazem com
que esses seres desenvolvam um metabolismo secundário muito eficiente, o
que os torna capazes de se defender quimicamente, segundo Letícia.
Como resultado, as espécies marinhas formam uma grande fábrica de
moléculas complexas e que apresentam mecanismos de ação inéditos e de
interesse científico.
Substâncias anticâncer
Letícia ressalta que essa complexidade adiou as descobertas de
substâncias marinhas, sendo que as pesquisas na área se intensificaram
somente a partir da década de 1950, quando surgiram as primeiras
técnicas de estudo.
"Nossa fronteira mais recente são os microrganismos marinhos. Um
grama de sedimento marinho chega a conter 1 bilhão de bactérias, um
número bastante alto", disse. Esses microrganismos são encontrados em
invertebrados, sedimentos e até na água do mar e a sua fermentação em
laboratório também resulta em substâncias bastante complexas.
De uma espécie de ascídia endêmica no litoral do Nordeste, por
exemplo, o grupo da UFC isolou duas moléculas estauroporinas que
apresentaram atividades anticâncer. Agora, os pesquisadores estão
isolando microrganismos da ascídia na tentativa de encontrar entre eles
os produtores dessas moléculas. A partir dessa identificação será
possível produzir os compostos por meio da fermentação.
A ação antitumoral foi testada com sucesso em animais e também in
vitro. Para os testes em células, os cientistas contam com um banco de
50 linhagens de células tumorais mantido pelo Laboratório Nacional de
Oncologia Experimental da UFC. "Os testes mostraram que os compostos
atacam preferencialmente as células tumorais", disse Letícia.
Atenuante para quimioterapia
Da alga marinha parda Sargassum vulgare, a equipe cearense isolou uma substância capaz de atenuar os efeitos colaterais da quimioterapia, além de potencializar a atividade antitumoral do agente quimioterápico.
"Os quimioterápicos atacam o sistema imunológico, diminuindo as
defesas do organismo. Nós conseguimos reverter esse efeito mantendo ou
até melhorando a atividade antitumoral", disse Letícia, ressaltando que
até agora só foram realizados testes em animais.
A leucopenia, queda do número de glóbulos brancos provocada pela
quimioterapia, foi completamente revertida nesses ensaios e a atividade
antitumoral chegou a aumentar cerca de 30%.
Os resultados abrem perspectivas para que a substância seja aplicada
como um coadjuvante no tratamento quimioterápico. Já está em andamento o
processo de depósito de uma patente para esse produto antitumoral e
imunoestimulante, resultado de parceria entre a UFC e uma empresa
privada.
Além da patente, a parceria visa também a desenvolver um processo de
produção da Sargassum vulgare. Segundo Letícia, um fator facilitador é
que a substância é um polissacarídeo já presente na alga, ou seja, é uma
molécula estrutural.
"Muitas vezes, a substância de interesse deriva de um processo
natural que deve ser reproduzido, como uma situação de estresse, por
exemplo, que desencadeia a produção de um determinado composto",
explicou.
Uma bactéria marinha associada ao sedimento demonstrou seletividade
para células que superexpressam os receptores dos fatores de
crescimento, característica de células tumorais. "Apesar de estar ainda
em fase inicial, a pesquisa apresenta perspectivas para se descobrir
mecanismos voltados a encontrar e atingir somente células de tumores",
disse Letícia.
Fonte:http://www.diariodasaude.com.br/news.php?article=mar-fabrica-medicamentos-naturais&id=5725
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